Parecia um tecido bem felpudo e por isso mesmo muito macio aquela parte do céu que se conseguia enxergar pelo vidro do ônibus lotado. Claro, estava muito lotado porque com certeza todos querem chegar em casa mais cedo, levarem à boca suas comidas meio frias ou requentadas num microondas quebra-galho acomodados com certo conforto num sofá em frente à tv que lhe fala sobre a previsão do tempo em São Paulo. Ali, no transporte coletivo de péssima qualidade que faz o percurso entre a universidade e o lado norte de Taguatinga, conseguira uma cadeira daquelas que ficam mais altas por estarem em cima dos pneus e, de colunas meio arqueadas para garantir a si mesma uma posição semirrelaxada - muito embora saiba que isso lhe trará problemas médicos futuros - enxerga no belo violáceo celeste o resto de uma natureza selvagem e exuberante que já predominou naquele espaço em tempos mais remotos. Antes de Jucelino? Será? Quando esse tempo, especificamente? Não seria antes mesmo de Anhanguera? Cadê a precisão destas medidas? Uma universitária, era o que ela era, devia ser capaz de elaborar com mais definição todas essas categorias e nomenclaturas que envolvem o passado, o presente e o futuro. Para onde, afinal tinham ido todas as teorias, reflexões e debates em torno da história? Pergaminhos, documentos, alfarrábios, papéis oficiais de toda ordem e toda sorte? Capítulos de livros, artigos em revistas, programas de televisão, entrevistas nas rádios, opiniões em blogs, troca de emails, presenças em videoconferências? E então...
O quê, então? Somente os sentidos e a memória.
Adorei. Duro e sensível ao mesmo tempo.
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